Dia do Cinema Nacional: qual a riqueza das produções brasileiras
Cinema brasileiro tem obras e realizadores importantes para a sétima arte, além de evoluir em produções médias
Dos 20 filmes com maior bilheteria no Brasil, em 2018, apenas três eram produções nacionais, segundo um anuário da Ancine (Agência Nacional do Cinema). Em um recorte mais amplo, de 2009 a 2018, o cenário não muda muito, passando para quatro filmes brasileiros entre os de maior bilheteria no país. Os números, ainda que façam parte de um cenário bastante complexo em que estão envolvidas questões econômicas e culturais, podem ser um reflexo de uma visão que persiste na cabeça de muita gente: a de que o cinema brasileiro é fraco ou ruim.
Para Celina do Rocio Paz Alvetti, jornalista, pesquisadora e professora do curso de Jornalismo da PUCPR, a rejeição ao cinema nacional vem diminuindo nos últimos anos, principalmente porque a qualidade das produções consideradas médias tem se aproximado dos filmes estrangeiros do mesmo porte. Porém, é algo que ainda existe por conta da comparação com produções internacionais e, também, dos temas trazidos pelo cinema nacional. “Há uma aculturação muito forte ao cinema americano, que é um cinema de bastante glamour, um cinema de evasão e de maior distanciamento do real. Enquanto isso, no Brasil, temos um cinema muito ligado ao factual, à crueza da vida”, explica.
A representação “da vida como ela é”, marca de muitos filmes brasileiros, começou próximo aos anos 60, com o Cinema Novo, movimento cinematográfico representado, principalmente, pelos filmes de Glauber Rocha e que mostrava de maneira bastante direta a realidade de violência e subdesenvolvimento vivido pelo Brasil da época. Esse, inclusive, é também um dos fatores possíveis para explicar, historicamente, a dificuldade dos brasileiros de aceitarem as produções nacionais, além das questões de contexto econômico, de acordo com a professora. “Logo antes do Cinema Novo, tivemos as chanchadas, do Grande Otelo, do Oscarito, que tinham bastante aceitação popular e, embora sejam considerados, hoje, filmes reveladores do modo de vida, eram percebidos de forma mais leve pelo público. Algo bem diferente do que acontecia com o Cinema Novo”, explica a professora.
Bem recebidos pelos brasileiros
No ranking da Ancine com as 20 produções brasileiras de maior bilheteria, de 2009 a 2018, os primeiros cinco colocados aglutinam filmes cujos temas estão ligados a temáticas cristãs e comédias, além do já clássico Tropa de Elite (1º Lugar: Nada a Perder 2, 2º Lugar: Os Dez Mandamentos – O Filme, 3º Lugar: Tropa de Elite 2, 4º Lugar: Minha Mãe é uma Peça 2 e 5º Lugar: Se Eu Fosse Você 2).
Para Celina, alguns fatores ajudam a explicar o sucesso destes filmes: “há a questão do pertencimento das pessoas, que se identificam com as histórias relacionadas à religião e, no caso de Tropa de Elite, acredito que tenha o fator roteiro, que é mais americano e, portanto, gera maior reconhecimento das pessoas. Além do marketing, que com o tempo construiu uma imagem de um filme adequado ao momento do país”, explica. Já no caso das comédias, a professora observa que há um esforço de produção destes filmes e que, portanto, não se pode desvalorizar o cinema de porte médio. “O Paulo Gustavo, por exemplo, do Minha Mãe é uma Peça, é um bom ator e faz muito bem aquilo a que se propõe”, defende.
Contribuições para a sétima arte
Produções como Central do Brasil, que rendeu uma indicação de Melhor Atriz para Fernanda Montenegro, e outra de Melhor Filme Estrangeiro, bem como Cidade de Deus, que recebeu quatro indicações ao Oscar, foram algumas das produções brasileiras com relevância internacional, mas as contribuições vão além de bons filmes esporádicos.
Cineastas brasileiros tem se destacado como fontes de estudo para o cinema, inclusive fora do país. Um deles é Glauber Rocha, justamente um dos maiores representantes do Cinema Novo. “Identificaram um lampejo de genialidade nele, porque permitiu discutir o papel do cinema no mundo, de estar e produzir em lugares que tinham questões políticas e sociais a se resolver”, explica Celina. “Mais recentemente, temos Fernando Meirelles e Walter Salles, que estão se destacando como realizadores importantes, e Eduardo Coutinho, um documentarista brasileiro que trouxe um cinema documental mais intimista, e tem boas perspectivas de se tornar referência, o futuro vai nos dizer”, complementa.
Entre as produções dirigidas por Fernando Meirelles estão Cidade de Deus, Tropa de Elite e Ensaio Sobre a Cegueira. Já Walter Salles tem no currículo as direções de Central do Brasil, Diários de Motocicleta e Abril Despedaçado. Eduardo Coutinho, por sua vez, foi o responsável pela direção do documentário sobre o Edifício Master, do Rio de Janeiro.
O que é que o Cinema Brasileiro tem?
Assim como em outros aspectos do Brasil, a riqueza do cinema nacional está na sua diversidade, segundo Celina. “Temos produções formalmente próximas do cinema mais comercial, filmes que rejeitam um pouco isso e buscam a forma da expressão artística, e outros, ainda, que transitam entre o mercado e a representação, além de documentários e curtas metragens”, explica. “Essa última categoria, inclusive, tem ganhado relevância e pode ser um caminho para quem quer começar a conhecer melhor o cinema nacional”, observa. É possível encontrar diversos títulos disponíveis gratuitamente no portal Porta Curtas.